Casado com Mony, um mulherão de arrasar a torcida do Galo, Roberto sempre se achou um garanhão. Bonito não era, remediado para algumas distraídas e indiferente para tantas outras, mas continuava se achando e fazendo gracejos para muitas, apesar da idade avançada e dos cabelos brancos. Roberto, tal qual o xará cantor, se achava o cara.
Nada, no entanto, bota o homem por inteiro na realidade nua e crua da vida do que a idade. Passado dos setenta, começa a sentir o peso, a retração do desejo, a limitação nas vistas e, até mesmo, a libido descendo serra abaixo. Roberto, no entanto, era diferente ou assim se fazia de conta. Mas aí o coração começou a dar sinais estranhos, consultas daqui e dali, mais exames aqui e na capital, até que o cateterismo se tornou indispensável, acrescido de recomendações médicas que impediram tomar sereno e cerveja na varanda, ter muitas emoções e evitar esforços. A quarentena do homem durou mais de cem dias, mas como tudo na vida, passou.
Roberto está voltando à rotina e já até percebeu que aquela morena da padaria tem pernas mais bonitas que as dele. Combinou com Mony um 'teste drive'. Marcaram dia e hora, levaram o filho para a casa da irmã, trancaram a casa, botaram um CD com boleros do Waldir Silva na vitrola moderna e começaram o aquecimento. Quando ele percebeu que estava na hora de tirar a roupa a campainha da casa tocou. Ele não acreditou e ficou quietinho, fazendo com o dedo no meio da boca o sinal de silêncio para a mulher. Não adiantou porque o carro na garagem denunciava a presença deles. A campainha tocou mais umas duas vezes e ele foi lá atender.
- Ô Oreba, vim fazer uma visita para ver como você está!
Era um amigo antigo e que não dava para dispensar. Abriu a porta, recebeu a visita na sala, lhe serviu uma cerveja e Mony foi para a cozinha preparar o tira-gosto. Papo rápido, não mais do que hora e meia. Despedida afinal, fecharam a casa de novo e tentaram recriar o clima com novo aquecimento. Até que deu certo e já estavam sem roupa quando a campainha toca de novo. A decepção caiu como uma máscara sobre os rostos de marido e mulher. Será que o amigo esqueceu alguma coisa e voltou? Ou seria outra visita? Na terceira campainha, decidiram vestir a roupa e sair para ver.
- Olá amigão, beleza, beleza?
Era outro amigo que vinha visitar Roberto. Casa reaberta, outra cerveja (só para o visitante, é claro), fogão esquentando o tira-gosto que sobrou e o monólogo do visitante correndo solto. Hora e meia depois a despedida. Desânimo total, mas Roberto estava meio alterado a pressão e temperatura foram medidas.
- Hoje não dá mais porque sua pressão está um pouco alta e é melhor ver Netflix, disse a esposa Mony.
Roberto pensou em ver Bruna Surfistinha, mas foi repreendido na hora.
- Nada disso! Vamos assistir “Mamãe é uma peça” e depois é cama pra dormir!
Roberto não é mais o mesmo...
(*) Márcio Passos é jornalista e fundador do A Notícia