Desde 1984
Hortência Carvalho
20 de Abril de 2023
O combate à fraude das cotas de gênero

Merece destaque o julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), publicado no último dia 31, que cassou a chapa dos candidatos a vereador de Belo Horizonte pelo Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB) nas eleições de 2020. A cassação incluiu a vaga anteriormente ocupada pelo segundo vereador mais votado da capital, Nikolas Ferreira. Ele se elegeu deputado federal, pelo PL, sendo o mais votado do Brasil e o mais votado da história de Minas Gerais.
Por força da decisão, o atual suplente empossado de Nikolas Ferreira, perde o seu mandato, dando lugar a outro candidato e de outro partido, já que todos os demais candidatos do PRTB foram cassados. Mas, por qual razão, o TSE tomou esta decisão tão dura e implacável? 
Isso ocorreu por ter entendido que o partido utilizou de candidaturas femininas fictícias para alcançar a quantidade mínima de candidatas e poder lançar o maior número que a lei permite de candidatos do sexo masculino. É o que se conhece como fraude da cota de gênero. 
A legislação determina que cada partido deve preencher o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo para os cargos de vereador, deputado federal e estadual. Geralmente, a dificuldade dos partidos é encontrar o quantitativo equivalente a 30% de mulheres candidatas, já que ainda são poucas que participam ativamente da vida política. Por isso, lançam nomes femininos só para compor o percentual, sendo que, por vezes, nem as próprias mulheres “candidatas” votam nelas mesmas.
Nesses casos, os indícios de fraude são vários e vão muito além da votação ínfima, ou mesmo zerada. Não se faz qualquer material de campanha para elas, não há participação adequada na propaganda eleitoral e não há recursos financeiros para suas candidaturas. Veio em boa hora uma decisão desse quilate, eis que criará um precedente para decisões similares nas eleições municipais de 2024. E, antes disso, terá efeito educativo e moralizante para os partidos de todos os municípios do país, no ato de escolha de suas candidatas para o próximo pleito.
Não é a primeira vez que o TSE julga neste sentido. Nas eleições de 2016, na cidade de Valença, no Piauí, foi reconhecida fraude na cota de gênero, caso julgado pelo TSE em 2019. Na ocasião, seis vereadores eleitos perderam o mandato, dos 11 que compunham a Câmara Legislativa do município.
É importante que os líderes partidários municipais conheçam esse atual entendimento do TSE e tenham prudência no ato de escolha das candidaturas femininas de seu partido. Isso porque, se a fraude é constatada, o efeito da cassação é cascata, ou seja, atinge todos os candidatos do partido fraudador, inclusive os eleitos. Isto ocorre porque entende-se que o vício está na composição da chapa do partido, e não se isola só nas candidaturas femininas fictícias, já que o que se fraudou foi o percentual mínimo da cota de gênero e não uma candidatura em si.
A ação que investiga e apura a fraude é a “Ação de Investigação Judicial Eleitoral”, cujo resultado final dificilmente ocorre antes da eleição, diante da sua complexidade de provas. Portanto, quando apurada a fraude, atingirá o mandato eletivo do candidato eleito caso a fraude tenha ocorrido na sua legenda.
Todo esse rigor vem somar forças para incentivar o ingresso de candidaturas femininas fortes, com chances de se eleger, em prol da igualdade de gênero e como forma de trazer ao parlamento mais mulheres a representar a nação feminina na política brasileira. 

 

(*) Hortência Carvalho é chefe do Cartório Eleitoral. Instagram: @hortenciacarvalho2009

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